Ao longo da história, o comércio, uma das atividades econômicas mais tradicionais realizadas pelo homem, foi submetido de maneira gradual a inúmeras transformações. Milênios separam o escambo do pagamento com cartões de crédito, as pequenas tendas dos hipermercados e os produtos artesanais dos conteúdos digitais. No entanto, nas últimas décadas, a atividade vem sendo submetida a uma verdadeira revolução, determinada, sobretudo, pelo e-commerce, inovação que começou a ser implementada no varejo durante os anos 1990, mas que ainda se encontra em plena expansão.
Com o surgimento da internet e de outras tecnologias genéricas, inúmeras aplicações vêm alterando não apenas a forma de comercialização, mas também diversas práticas associadas à administração da firma varejista, à gestão de cadeias de fornecimento, ao marketing, às formas de pagamento e ao relacionamento com clientes. Dentre essas tendências tecnológicas recentes, duas vêm favorecendo fortemente o e-commerce, além de mudar a relação das pessoas com o varejo: as tecnologias móveis, que reduzem substancialmente as barreiras de tempo e de lugar para a efetivação da demanda, e as mídias sociais, que propiciam novas experiências de consumo, maior acesso dos empreendedores ao mercado virtual e ampliam o volume de informação disponível para os consumidores.
Cenário no Brasil
O Brasil desperta a atenção de investidores internacionais e recebe destaque em diversos estudos setoriais, já que a escala e a dinâmica de seu mercado o distingue dos demais países da América Latina. A consultoria Nielsen estima que, em 2018, a receita apenas em e-commerce e marketplace (B2C) tenha alcançado R$ 53 bilhões no país, além de mais R$ 80 bilhões nos segmentos de marketplace de produtos novos e usados (B2C e C2C, como o Mercado Livre), turismo (passagens aéreas, hotéis e pacotes e locação de veículos) e ingressos (cinema, shows, teatro, esportes etc.). Considerando todos esses segmentos, a receita total nos últimos três anos cresceu como ilustrado no gráfico abaixo.
Evolução recente do faturamento nominal do comércio eletrônico, Brasil

Fonte: Nielsen
O Brasil é o país com o maior faturamento entre os da América Latina – 36% da população é digital buyer
A expansão até esse cenário vem se dando a taxas elevadas há cerca de duas décadas. Diversos fatores contribuíram para essa dinâmica, entre eles, o crescimento econômico com inclusão social, a ampliação da infraestrutura de telecomunicações do país, a difusão de dispositivos eletrônicos conectáveis à internet, além de mudanças no comportamento dos consumidores.
Vantagens do e-commerce para a estruturação do mercado varejista
Mais do que uma mera forma de comercializar, a verdadeira importância do desenvolvimento do e-commerce para a economia brasileira está em sua capacidade de alterar a lógica do mercado varejista e a estrutura interna das firmas, de ampliar a coordenação de cadeias de valor e de aumentar o bem-estar dos consumidores.
Por colocar em um mesmo ambiente firmas antes separadas por barreiras geográficas, o comércio eletrônico tende a elevar o patamar da competição no setor varejista. Para conquistar espaço em um mercado promissor, mas caracterizado por alta rivalidade, firmas praticantes do e-commerce tendem a investir na modernização de suas operações e a contratar profissionais qualificados, o que as torna mais eficientes e intensivas em conhecimento. Somando-se a isso o fato de que os varejistas on-line observam em tempo real o comportamento dos consumidores, pode-se afirmar que o e-commerce contribui para a consolidação do varejo como condutor de cadeias de valor e, em alguma medida, como difusor de eficiência em parte significativa do tecido produtivo.
Para os consumidores, o comércio eletrônico tende a aumentar o bem-estar por meio de diversas frentes. Além de conveniência, as vendas on-line oferecem preços mais competitivos, acesso a maior sortimento de produtos, grande volume de informações e diferentes experiências de consumo. Com o advento das tecnologias móveis e das mídias sociais, os consumidores deparam-se ainda com menores barreiras de tempo e espaço para efetivação de suas demandas, acesso a experiências de consumo de sua rede de contatos e maior influência sobre o comportamento dos varejistas, dado que podem comparar preços a qualquer momento (inclusive no interior de lojas físicas) e compartilhar rapidamente com outros consumidores eventuais elogios ou insatisfações.
Futuro do varejo on-line
Para o futuro próximo, espera-se que a atividade continue a se expandir no país. O recente aumento do número de pessoas que efetuaram sua primeira compra on-line e a emergência de novas formas de comercialização pela internet sugerem que o movimento de alta deve manter-se no curto prazo – mesmo que o varejo em geral não cresça como no passado recente, o e-commerce deverá ganhar participação no total das vendas.
Os prognósticos também são positivos para um horizonte mais distante. Independentemente do desempenho econômico do país nos próximos anos, a evolução de aplicações das TIC no varejo vem resultando na criação de facilidades que paulatinamente incorporam-se à realidade do Brasil. O big data e a computação em nuvem, por exemplo, já são empregados por alguns varejistas brasileiros. Outras tecnologias, como pagamentos móveis, internet das coisas e impressoras 3D, deverão impactar significativamente o varejo on-line e off-line nos próximos anos. Além disso, em um futuro não muito distante, o mercado de trabalho do país absorverá uma geração acostumada com novas tecnologias (chamada de geração smartphone), hiperconectada a redes sociais e a fóruns de consumidores, menos temerosa de realizar transações on-line e menos apegadas às marcas tradicionais do varejo. Nesse contexto, as firmas varejistas (e alguns ramos dos serviços) deverão se deparar com grandes oportunidades, mas também com diversos desafios, que só serão superados com investimento em infraestrutura, tecnologia e conhecimento.
Com forte presença no setor de comércio e serviços, o BNDES tem dado suporte a planos de investimento em e-commerce de diversas empresas brasileiras, bem como a empreendimentos logísticos e a investimentos em TI. Trata-se de um núcleo de alto valor agregado do setor terciário que se encontra em expansão e tende a demandar recursos crescentes.
Rangel Galinari: bacharel e mestre em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais, técnico do Departamento de Inteligência para Prospecção e Gestão de Clientes Governamentais, da Área de Governo e Relacionamento Institucional do BNDES. Ex-economista da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Osmar Cervieri Junior: bacharel em Engenharia de Produção pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestrando em Economia pela Faculdades IBMEC - Rio de Janeiro, técnico de estudos setoriais do Departamento de Bens de Consumo, Comércio e Serviços do BNDES, ex-engenheiro da Petrobras.

Job Rodrigues Teixeira Junior: bacharel, mestre e doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, gerente de estudos setoriais do Departamento de Bens de Consumo, Comércio e Serviços do BNDES, ex-economista do Departamento de Cultura, Entretenimento e Turismo do BNDES, ex-economista do INPI e ex-professor assistente 40h DE do Instituto Multidisciplinar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Eduardo Lederman Rawet: bacharel em Ciências Econômicas pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Teoria Econômica pelo IPE-USP e ex-estagiário de economia do Departamento de Bens de Consumo, Comércio e Serviços do BNDES.
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